Está na mesa da Aneel uma complexa questão. Trata-se da decisão a ser tomada em relação ao ressarcimento aos consumidores finais de valores cobrados a mais de ICMS nas contas de energia relativos ao cálculo do PIS/Pasep (Programa de Integração Social) e da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social).
O valor do PIS/Pasep e Cofins sempre foi calculado tendo como base toda a receita auferida pelas concessionárias de energia, o que incluía o valor cobrado a título de ICMS pelo estado da Federação. Assim, em um exemplo bem resumido (na vida real, nada é tão simples assim), o faturamento se dava historicamente da seguinte forma:
Ocorre que em outubro de 2017, o Supremo Tribunal Federal, com relatoria da Ministra Carmem Lúcia, publicou acórdão, ficando consignada, com base do princípio da não cumulatividade (popularmente chamado de bitributação), a obrigatoriedade de a Fazenda Nacional excluir o ICMS da base de cálculo do PIS/Pasep/Cofins. Entendeu o STF que o ICMS não se qualifica como receita pertencente à concessionária e portanto não poderia ser incluído na base de cálculo.
No mesmo exemplo simplificado mostrado acima, o faturamento deveria ter sido feito de acordo com o seguinte esquema:
O julgamento do STF ocorreu devido a diversas ações judiciais propostas por parte das concessionárias e permissionárias de distribuição pleiteando a mesma tese da exclusão do ICMS da base de cálculo. Muitas dessas ações, algumas propostas há quase quinze anos, já transitaram em julgado, mesmo antes da decisão da suprema corte em plenário. Desde a publicação do acórdão pelo STF, o critério de faturamento adotado pelas concessionárias e permissionárias segue a nova ordem definida naquela corte, excluindo o ICMS da base. Entendem as concessionárias que, pelo fato de terem patrocinado essas ações judiciais, longas e dispendiosas, em nome de seus consumidores, também fazem jus a parte desse crédito.
Entre março e maio de 2020, a Agência instaurou uma Tomada de Subsídios (TS 005/2020), para colher opiniões de interessados da sociedade sobre o tema. Basicamente, a TS questionava como devem ser devolvidos os créditos aos consumidores finais, em quanto tempo, como as concessionárias deveriam se ressarcir dos custos judiciais das ações propostas em defesa do consumidor de sua área de concessão e, por fim, quais as alternativas de operacionalização da devolução.
Após isso, a Aneel solicitou às concessionárias e permissionárias de energia novas informações sobre o andamento de ações judiciais que essas empresas já vêm movendo contra a Fazenda Nacional.
Em 2020, por ocasião de duas revisões tarifárias, da Cemig D e da EDP Espírito Santo, a Aneel deliberou pela antecipação da devolução dos créditos ao consumidor, reduzindo o reajuste. No caso da Cemig D foi definido uma componente financeira negativa de R$714 milhões no processo de reajuste tarifário referente a parte dos depósitos judiciais da ação que a Cemig D movia questionando a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/Pasep Confins.
O próximo passo agora é a coleta de sugestões por meio da Consulta Pública 05/2021, aberta a contribuições até 29/3/21. A Aneel, em voto dado pelo Diretor Efraim Cruz no mês passado, quando propôs a abertura da CP para a avaliação da proposta de devolução dos créditos, estabeleceu também que, nos casos em que haja a possibilidade de aumento tarifário expressivo, poderá haver antecipação dos créditos em favor dos consumidores finais, limitado a 20% do total envolvido nas ações judiciais, tal qual já aconteceu com a Cemig D e a EDP Espírito Santo. No mesmo voto, o Diretor estima, em análise superficial, que esse valor recolhido em montante superior ao que agora se tem como devido supera R$50 bilhões. Não é pouca coisa!